segunda-feira, 19 de julho de 2010

Reflexões…

Há muito, muito tempo, era uma vez um jovem príncipe preocupado e empenhado com os assuntos da governação do reino. Como todos os jovens normais, também o nosso jovem príncipe tinha o seu grupo de amigos, em quem confiava, e com quem contava, quer para o acomodar nas tropelias da corte quer para o aconselhar em diversas matérias.

Um certo dia, o melhor amigo do nosso jovem príncipe informa-o que vai convidar um dos seus amigos (que o príncipe não conhecia) para integrar a corte. Como é sabido, nessa altura apenas era permitido integrar a corte às pessoas que fossem devidamente convidadas e autorizadas. O amigo do nosso jovem príncipe, vendo que o seu amigo já havia demonstrado, fora da corte, a sua competência e aptidão, e reconhecendo que este poderia ser uma mais-valia em termos militares e de influência, pois era possuidor de vastas terras e de um grande exército, considerava útil que este viesse para a corte.

Mas eis que o pai do nosso príncipe, o rei, estava a envelhecer, e à medida que o tempo de se tornar rei se aproximava, o nosso jovem príncipe começava a tornar-se cada vez mais desconfiado, quase com medo da própria sombra, vendo em qualquer lado um inimigo.

Ora, vendo neste estrangeiro uma potencial ameaça, o nosso príncipe tentou convencer o seu amigo a não o convidar a integrar a corte, deixando vincada a sua posição: o estrangeiro poderia integrar a corte mas nunca integraria o seu grupo de amigos nem seria uma pessoa bem-vinda. Dizia o jovem príncipe que este estrangeiro era um interesseiro e um oportunista, que apenas tinha terras e exércitos graças ao apoio de outros príncipes estrangeiros e que não perderia a oportunidade de o derrubar caso tivesse esta possibilidade. Contrariado acabou por se resignar à vontade do amigo, que persistente, manteve a sua posição.

Algum tempo mais tarde, o rei morreu e o nosso jovem príncipe tornou-se rei. Confiando no seu melhor amigo atribuiu-lhe o cargo de chanceler e começou a escolher as pessoas para integrar o conselho real. É então que o seu chanceler lhe recomenda o nome do estrangeiro. Após bastante discussão e após ouvir mais alguns dos seus amigos, o príncipe acabou por aceitar a recomendação. O rei não gostava do estrangeiro, nunca o tinha aceite no seu grupo de amigos, mas acaba por designá-lo como conselheiro, chegando mesmo, a nomeá-lo seu secretário pessoal, não por lhe reconhecer competência ou por ter por ele admiração, mas apenas e só com o intuito de o manter por perto e sob controlo.

Com o passar do tempo a opinião do Rei e do seu chanceler sob o rumo a dar ao reino foi divergindo. Como bom amigo que era o chanceler sempre transmitia a sua opinião sincera e honesta, procurando ajudar o seu amigo. Contudo o Rei havia-se tornado prepotente e não gostava que discordassem dele. À medida que as opiniões iam divergindo, o Rei começou a olhar o seu chanceler com desconfiança.

O Secretário Pessoal (o nosso estrangeiro), apesar de ser amigo do chanceler, vendo uma hipótese de o substituir, começa a alimentar essa desconfiança e a apoiar as opiniões do Rei, quer concordasse com elas ou não. Alimentado pelo Secretário Pessoal, o Rei começa a ver no seu Chanceler um potencial inimigo, e decide afastá-lo do cargo e promover o secretário pessoal a chanceler. Depois de afastar o seu antigo amigo do cargo de chanceler, o Rei determina que este seja banido da corte e, algum tempo mais tarde, acaba por determinar que seja executado.

Esta é, resumidamente, a história de Henrique VIII, de Thomas More e de Thomas Cromwell, uma história que ainda hoje me fascina. A execução de Thomas More na Torre de Londres, no dia 6 de Julho de 1535, ordenada por Henrique VIII, foi considerada uma das mais graves e injustas sentenças aplicadas pelo Estado contra um homem de honra, consequência de uma atitude despótica e de vingança pessoal do rei. Algum tempo mais tarde o rei veria quem era na verdade Thomas Cromwell e este seria sujeito ao mesmo destino de More.

Esta história ocorreu há muito, muito tempo, mas, se pensarmos bem, histórias como esta continuam a acontecer ainda hoje, em sítios bem perto de nós. A intriga, o oportunismo, a falsidade e a hipocrisia continuam a ser, como então eram, marcas do nosso tempo, onde a injustiça continua a imperar. Mas, tal como Thomas More, continuo a acreditar que é possível ser diferente, que é possível aprender com a história e continuo a lutar pela realização do sonho e a tornar cada vez mais real a Utopia.

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